domingo, 20 de março de 2011

A montanha afinal não pariu um rato


Homenagem junta 20 grupos de várias áreas da música nacional

«Filhos da Madrugada», o álbum de homenagem a José Afonso, saíu finalmente do segredo dos deuses. Só estará à venda no próximo dia 27, mas o PÚBLICO apresenta-o hoje em antecipação. E das surpresas às meras confirmações nele incluídas, permite-se apresentá-lo como uma aposta ganha.

Há muito que se fala dele. «Filhos da Madrugada», o álbum em que vinte grupos da música pop nacional prestam homenagem a Zeca Afonso, um dos maiores, talvez o maior, compositor e intérprete da música popular do nosso país. Será também o maior projecto alguma vez tentado no nosso meio musical, partindo de uma iniciativa conjunta de Manuel Faria, Tim e João Gil, e que finalmente acabou por receber apoio de uma grande multinacional instalada no nosso país, bem como da organização de «Lisboa 94, Capital da Cultura». Um evento que vem comemorar não só a obra de José Afonso, mas também os 20 anos da Revolução de Abril, de que este foi um dos porta-vozes antes, e depois, dela acontecer.

Disponível a partir de 27 de Abril, no formato de um duplo CD, «Filhos da Madrugada» reúne a «nata» da nossa música actual: dos GNR aos Opus Ensemble, dos Censurados aos Madredeus, dos Mão Morta à Brigada Vítor Jara.

Há algum material previsível, mas, na sua maioria, as canções estão bem conseguidas, o que faz desta uma aposta ganha, não só pela reconhecida qualidade dos originais, como por uma média de interpretações bastante acima do aceitável. Há mesmo algumas surpresas, como a interpretação de «Os índios da meia praia», pelas Vozes da Rádio, um novo grupo oriundo do Porto constituído apenas por vocalistas, que se estreia aqui nas lides discográficas, e que pela amostra, deixa bastantes promessas no ar. Há também a versão de «Vejam bem» pelos Delfins, que optaram aqui por uma incursão num campo próximo da «ambient-house» de tendência britânica, misturando ambiências de música electrónica com um tom dramático já habitual neles. E «Cantigas do Maio», que a Sétima Legião injectou de rítmicas étnicas, ao jeito que já se apontava em alguns temas do seu último álbum, «O Fogo». E ainda «O avô cavernoso», que os Mão Morta reconverteram em estilo ameaçador, aliás como já tinham feito com «Visões-Ficções (Nostradamus)» de António Variações.

Depois há as versões que não são particularmente surpreendentes no seu formato, mas que demonstram óptimas interpretações e arranjos de bom gosto, que constituem a maioria do material aqui incluído. Neste caso estão a de «Maio Maduro Maio» pelos Madredeus, com a voz de Teresa Salgueiro num registo diferente do habitual, ou «A formiga no carreiro» que se adaptou extremamente bem ao imaginário dos Sitiados, aqui com um naipe instrumental (flauta, percussões, violino, e teclas) que lhes veio conferir uma dimensão alargada. Os Tubarões também conseguiram uma boa interpretação, adaptando o conhecido «Venham mais cinco» aos seus peculiares ritmos africanos e transformando o tema num imparável tema de baile. Os Xutos & Pontapés, por sua vez, tomaram por seu o «Coro da Primavera» absorvendo o seu pendor épico e devolvendo-o envolto numa torrente de electricidade bem a seu jeito. O mínimo que se pode dizer é que ficou poderoso.

Consagrados "diferentes"

Há mais vertentes. Uma é a da facção pop-rock de pendor mais ou menos grandioso, onde se podem incluir os Entre Aspas com a sua reconversão de «Traz outro amigo também», os Ritual Tejo com «Canto moço», o tema cujo primeiro verso deu origem ao nome do disco, ou os UHF com uma versão retórica de «A morte saíu à rua». Outra é a das aparentes contradições, como as que se podem estabelecer entre «Era um redondo vocábulo», que os Opus Ensemble transformaram num instrumental de dramatismo neo-clássico para fechar o CD 1, e um tema carregado de irreverência como «O homem da gaita», que os Peste & Sida não terão tido grande dificuldade em adaptar ao seu próprio imaginário. Ou aquela que aparentemente opõe a Brigada Victor Jara, e a sua versão de pendor tradicional para «Ronda das mafarricas» ao interventivo e «pesadão» «O que faz falta», particularmente bem adaptado ao estilo dos Censurados. Mas mais que demonstrar uma incoerência entre os participantes, estas disparidades só vêm reforçar a ideia de riqueza e variedade inerente ao próprio património de José Afonso, que a maior parte dos presentes só teve de escolher e adaptar às suas próprias características. Quase se poderia dizer que nele se encontravam todas as pequenas sementes que, germinando, resultaram na variedade de opções possíveis de encontrar na música nacional dos nossos dias.

No campo dos grandes consagrados, caso dos GNR e Resistência, é curioso verificar que as suas interpretações têm «um não sei quê» que não os faz afastar demasiado das suas próprias premissas, mas que também não é meramente uma transposição dos seus próprios tiques para a música de José Afonso. No caso dos primeiros, o «Coro dos tribunais», funciona como uma espécie de anti-clímax «à lá» GNR, onde é perfeitamente reconhecível a sonoridade do grupo, e as características mordazes da canção -- fortemente ligadas ao estilo da escrita de Reininho --, mas que depois demonstra um desfasamento quase propositado da intenção marcadamente comercial a que os GNR nos habituaram nos últimos tempos, e que a canção obviamente não tem. Por seu lado, os Resistência aproveitaram «Chamaram-me cigano», tema sem grande carga ideológica, para porem as suas guitarras acústicas à desgarrada, o que dá uma sensação de muito maior gozo e liberdade por parte dos próprios músicos que acaba por se transmitir para quem ouve. O aparato ideológico, que por muitas vezes tornou a sua música demasiado pomposa, é assim praticamente afastado, distanciando-se esta interpretação do imaginário habitual do grupo, apesar de, como acontece com os GNR, pela sua sonoridade o tema ser imediatamente reconhecível como tocado por ele.

Curiosa é também a facção que, apesar de ser integrada por músicos de uma geração muito posterior à de Zeca Afonso, de alguma forma se lhe aproxima nos propósitos de junção entre a tradição e a modernidade. É o caso dos Frei Fado D'El Rei e a sua versão de «Que amor não me engana», dos Essa Entente, (os dois grupos vencedores do concurso levado a cabo para recolha de participações de bandas menos conhecidas) com «Senhor Arcanjo», ou os Diva com «Canção de embalar», que conseguiram um efeito conciso e eficaz, juntando elementos destes dois pólos por vezes antagónicos (poder-se-ia acrescentar-se-lhes ainda os Sitiados e mesmo os Madredeus ou a Sétima Legião).

«Grândola Vila Morena», talvez o tema mais conhecido de Zeca Afonso, e que de certo modo serve como um símbolo para o próprio 25 de Abril, é o «bónus» aqui incluído regravado por uma multidão que envolveu elementos da maior parte dos grupos, em conjunto com o Coro Infantil de Santo Amaro de Oeiras. Não tem a dimensão épica e grave do original, sobretudo porque se notam alguns desfasamentos entre os solistas intervenientes, mas ainda assim não deixa de ter alguma graça.

O resultado destes 44 dias de gravações, 20 de misturas e mais de dois anos de planeamento é assim vincadamente positivo, o que se não permite fazer previsões semelhantes para outros projectos do género -- muitas vezes mais aparato que resultados --, pelo menos desta vez significou uma homenagem condigna a uma das mais figuras que mais o merecia: José Afonso.

Jorge Dias / Público, 18/04/1994

terça-feira, 8 de março de 2011

Brindes do Passado

Com algum tempo de atraso, como é vulgar e de bom tom acontecer neste cantinho lusitano, a moda das homenagens chegou a Portugal. É verdade que por cá não abundam nomes de peso, vivos ou não, que justifiquem tais iniciativas, nem o necessário conhecimento de causa da parte de muitos dos celebrantes. Era preciso procurar mitos, artistas que povoassem o imaginário musical português, capazes de reunir o consenso e atrair tanto os jovens leões como os veteranos. Mas não foi preciso procurar muito. Assim, a jeito e com a estatura mínima pretendida, dois nomes se destacavam à partida, um deles já falecido, o outro ainda vivo e alvo de adoração do povo português: José Afonso e Amália Rodrigues.

O primeiro teve honras de grande acontecimento, através da edição do duplo contendo versões de canções suas, pelos Filhos da Madrugada, designação genérica que englobou praticamente todos os grupos mais conhecidos da pop nacional, mas deixou de fora pessoas que conviveram de perto e tocaram com o autor do «Coro dos Tribunais». Amália foi, para já, objecto de homenagem mais modesta, por parte de Dulce Pontes, que lhe repescou uma série de fados e adaptou o título de um deles para o seu próprio álbum, «Lágrimas». Por sinal, também José Afonso foi arrastado na corrente, aproveitando Dulce Pontes para homenagear de uma penada dois artistas cuja obra, ideologia e personalidade não poderiam ser mais opostos.

Enquanto isso, no Seixal, por ocasião das festas de Corroios, alguém se lembrou de editar um «Especial José Afonso: bandas de música moderna do concelho do Seixal interpretam José Afonso», disco que, curiosamente, não teve o mesmo sucesso de vendas que o dos Filhos da Madrugada. É que não se percebe muito bem o que têm grupos como os Oboé, Nível de Vida, Dixit, Últimos Suspeitos, Quatro++1, Tropa de Choque, Irmãos de Sangue e O Incesto a menos que os GNR, UHF, Sétima Legião, Resistência, Delfins, Madredeus, Peste & Sida, Mão Morta ou Sitiados!

O terceiro homenageado do ano foi outro falecido, António Variações, personagem controversa, ao contrário das outras duas, e, em vida, incómoda para muitos. Foi logo nos primeiros meses de 1994 que os nomes do costume decidiram juntar-se para umas «Variações» em torno deste artista, que adorava Amália, afirmava estar «entre o Minho e Nova Iorque» e misturava nas suas canções preocupações existenciais com uma vertente sonora electropop que, até hoje, permanece como uma das propostas mais originais da música popular feita em Portugal. Assim, aos especialistas nas homenagens, Delfins (Miguel Ângelo foi dos primeiros a compreender e a «apropriar-se» da música do cantor-barbeiro), Ritual Tejo, Madredeus, Resistência, Sitiados e Mão Morta, juntaram-se Sérgio Godinho, Isabel Silvestre, Santos e Pecadores (bela designação para uma hipotética banda do homenageado...) e Três Tristes Tigres, num álbum que recupera temas dos álbuns «Anjo da Guarda» (1983) e «Dar e Receber» (1984), os únicos que Variações editou em vida.

Foi pois no fundo do baú que muita gente andou a remexer nas raízes perdidas. Num tempo de vacas gordas em termos de vendas (para o qual contribuiu em grande parte a aposta -- ganha -- na exportação, por algumas multinacionais) para a música portuguesa, a que correspondeu um tempo de crise, em termos de aparecimento de novos valores (exceptuando a saudável investida das editoras independentes que apresentaram propostas de grande valor como as dos Bizarra Locomotiva, U-Nu ou Tina & The Top Ten, entre outras), investiu-se na bolsa dos valores seguros e na celebração de um classicismo que, inspirado nos tempos áureos da MPP ao longo das décadas de 60 e 70, ganhou novo eco na facção pop.

Nesta corrida ao passado encontrou muita gente o fôlego providencial para o relançamento de carreiras em risco de estagnação. Para outros, terá sido verdadeiramente uma sentida homenagem. Para outros ainda, o mero oportunismo e o embarque à última da hora no comboio da jogada comercial. Fossem quais fossem as intenções de cada um, ninguém pode negar, porém, a este fenómeno, das homenagens, uma virtude: a de trazer a música dos mestres para o convívio das gerações mais novas, provocando nelas, como já aconteceu nalguns casos (Paulo Bragança ou a própria Dulce Pontes, por exemplo) o desejo de retomar e actualizar a tradição.

Fernando Magalhães / Público, 27/12/1994

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Grândola

Público, 1994/03/09

«Filhos da Madrugada», o tão falado disco de homenagem a José Afonso, encontra-se já completamente gravado. A última sessão de estúdio, num clima que fez lembrar o do vídeo-clip de «We are the world», ocorreu no passado dia 4 de Março nos estúdios da Valentim de Carvalho em Paço D'Arcos, onde elementos de grande parte das vinte bandas que participaram no projecto (Sitiados, Xutos Pontapés, Resistência, Essa Entente, Ritual Tejo, Entre Aspas, Censurados, Delfins, Peste & Sida, Diva, Vozes da Rádio, Brigada Vítor Jara e Frei Fado D'El Rei), acolitados por 66 crianças do Coro de Sto. Amaro de Oeiras, finalizaram a gravação colectiva de «Grândola Vila Morena», o último tema do disco. Com saída prevista para 25 de Abril, precisamente vinte anos depois de «Grândola» ter servido de senha ao golpe militar que pôs termo à ditadura, «Filhos da Madrugada» será apresentado ao público num concerto conjunto das bandas participantes, anunciado para 30 de Abril no Coliseu dos Recreios de Lisboa. A organização de «Lisboa 94», que empresta a sua chancela ao concerto, anunciou ainda para Abril uma exposição sobre a vida e obra do cantor, bem como a edição de uma biografia actualizada, a cargo do jornalista José A. Salvador -- autor de «Livra-te do medo», até agora a única (e há muito esgotada) biografia de José Afonso.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

CD-Rom



Zeca Afonso em CD-ROM

O projecto Filhos da Madrugada, que já foi duplo álbum e concerto em Alvalade, chega agora ao formato CDROM através da editora BMG. É o método interactivo aplicado à música portuguesa, ou a possibilidade de qualquer um fazer misturas com os 20 temas do disco de homenagem a Zeca Afonso, desde que possua um leitor de CD-ROM (PC ou Macintosh, tanto faz). Mas temos mais: além de informações gerais sobre o projecto, há entrevistas com as bandas participantes e com o produtor do disco, Manuel Faria; cinco telediscos dos Sitiados, Madredeus, Delfins, Resistência e Xutos & Pontapés; letras integrais das 20 músicas e discografia do autor de Venham Mais Cinco. Tudo isto numa simples rodela de plástico com menos de um palmo de diâmetro. É obra.



"Filhos da Madrugada", edição BMG, Preço recomendado. 10000$00



CD-ROM
FILHOS DA MADRUGADA: REIVENTANDO ZECA FONSO - BMG INTERACTIVE - TEL(01- 4148020)

FILHOS DA MADRUGADA

Associação José Afonso e SIC não ajudam CD-ROM

O primeiro CD-ROM dedicado à música portuguesa, baseado no projecto «Filhos da Madrugada» e produzido pela BMG, está finalmente em fase de acabamento e deverá ser lançado até finais de Junho. A edição conheceu, no entanto, acidentes de percurso que impediram algumas das ideias iniciais de serem concretizadas.

«Filhos da Madrugada», como se sabe, é uma homenagem a José Afonso que deu origem a um duplo álbum, lançado no ano passado, por ocasião das comemorações do 25 de Abril, e depois a um concerto com as bandas participantes no registo, que ocorreu no Estádio José Alvalade. Ora o CD-ROM não oferece sobre o próprio José Afonso nada além da foto da capa, uma discografia e as letras das canções interpretadas no disco. Não há mais fotos, entrevistas, apontamentos de concerto, ou qualquer outro documento de arquivo sobre o cantor, pois a Associação José Afonso não os cedeu à BMG, preferindo demarcar o homenageado dos homenageantes.

Por outro lado, há cinco telediscos, com as participações de Delfins, Madredeus, Resistência, Sitiados e Xutos e Pontapés, mas ilustrados com imagens captadas durante a gravação áudio nos Estúdios Valentim de Carvalho. Apesar do concerto de Alvalade ter sido gravado pela Regi, os direitos de transmissão televisiva foram adquiridos pela SIC. Esta, entretanto, não cedeu material para o dito CD-ROM antes de o seu programa ir para o ar, o que aconteceu no último 25 de Abril, quando a produção do interactivo em memória do Zeca já ia em fase demasiado avançada para integrar novo material.
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Perante as câmaras instaladas no local (o evento foi também filmado para a realização de um vídeo-documentário sobre o projecto) o nervosismo não foi pouco, mas com o passar do tempo e as sucessivas tentativas, acabou por dissipar-se, acabando por originar aquela que será a gravação final, conseguida ao fim de 7 "takes". A gravação foi dividida entre o coro global, que cantou o refrão, e a participação dos solistas -- João Aguardela, dos Sitiados, Tim, dos Xutos & Pontapés e Resistência, Miguel Ângelo, também dos Resistência, e Delfins, Vivianne, dos Entre Aspas, Natália Casanova, dos Diva, Paulo Costa, dos Ritual Tejo, João Ribas, dos Censurados, Paulo Riço, dos Essa Entente, Nuno Aragão, das Vozes da Rádio, João Sampayo dos Peste & Sida e Carlos Aurélio da Brigada Vítor Jara, e ainda duas Saras e um Tiago, pertencentes ao coro de Sto. Amaro de Oeiras --, tudo sob a direcção do maestro César Batalha.


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A BMG Portugal já finalizou a produção do seu mais recente título, o CD-ROM "Filhos da Madrugada", uma homenagem de uma dezena de grupos portugueses ao poeta e músico Zeca Afonso. A versão final, em que já tivemos oportunidade de "dar uma voltinha" em primeira mão, terá a sua pré-apresentação durante o congresso da Portidata, a decorrer entre 26 a 29 de Outubro.

Toda a discografia de Zeca Afonso, "clips" audio, letras por extenso, entrevistas e vídeos com as actuações de grupos como os Sitiados, Madredeus, Xutos & Pontapés, entre outros, e mais surpresas... está tudo neste "Filhos da Madrugada".

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Os «Filhos da madrugada» por eles próprios

Público, 1994/04/19

Os «Filhos da madrugada» por eles próprios

O duplo CD, o resultado prático do maior projecto ligado à área musical jamais concretizado no nosso país, está quase na rua. Apreciações estabelecidas (ver edição do PÚBLICO do passado domingo), falta ouvir os participantes sobre as suas contribuições. E, já agora, sobre o próprio Zeca Afonso e a sua herança. Os depoimentos aqui reunidos foram extraídos do vídeo realizado sobre como foi elaborado o projecto, que virá a ser transmitido por um dos canais televisivos nacionais. Alguns são reverentes, outros talvez menos. Curiosa é, no entanto, a relação que estes músicos e grupos (a maioria), uma ou duas gerações mais novos que as obras que vieram agora interpretar, mantêm com o autor que as trouxe à rua.

GNR
«Coro dos tribunais»

«É mesmo a primeira vez que nos metemos numa destas! Sendo sincero, não somos fãs do Zeca Afonso, na generalidade do grupo. Há respeito (...), mas não somos dos que pertencem à `linha dura'. Até cheguei a ser irreverente, estava o senhor muito doente, levei cacetada nos jornais na altura: anunciei-lhe uma morte prematura num espectáculo no Rock Rendez-Vous. Nessas coisas sou um pouco iconoclasta, acho que as pessoas têm o respeito que devem ter. Ele realmente tem um grande nome na música mundial, não necessita daquele: `Ai, o Zeca!!!'»

Sétima Legião
«Cantigas do Maio»

Ricardo Camacho: «Sou suficientemente velho para ter conhecido o Zeca pessoalmente. Toquei com ele uma vez, numa colectividade aqui em Lisboa, ali para a Ajuda, sem PA, com megafone (...). Estava muito longe de imaginar que um dia viria a fazer uma versão de uma das canções dele. Foi a primeira vez que fizemos versões, e é muito bom começar pelo Zeca, porque é o maior compositor de música popular deste século. Cria uma responsabilidade adicional, porque não se pode recriar um tema do Zeca. São canções que exigem algum respeito. Cada um respeita-o à sua maneira».

Censurados
«O que faz falta»

João Ribas: «Em geral, as letras do Zeca Afonso e dos Censurados têm uma ligação (...), na contestação e na intervenção. Eu, que a cantei, digo que é como uma letra dos Censurados, quase!»
Fred: «Nós baseávamo-nos muito no que nos fazia falta. Quando fazíamos as músicas que fazíamos e cantávamos as letras que cantávamos, tínhamos essa preocupação de dizer às pessoas que nos ouviam `o que faz falta'.»

Delfins
«Vejam bem»

Miguel Ângelo: «Neste tipo de colectâneas há sempre algumas alternativas. Ou trazíamos esta canção do Zeca Afonso para o universo dos Delfins, no sentido tradicional do que são os Delfins, ou -- o que nos aliciou mais -- partíamos para outro universo, diferente do do Zeca Afonso e, até, do grupo. Neste caso foi uma incursão do grupo no território da música ambiental, da música de dança, e uma maneira, para nós, muito agradável de trabalhar.»
Fernando Cunha: «Em relação a esta experiência, quisemos ir mais longe, quisemos fazer uma fusão entre o conceito que vinha do `Ser maior', dos anos 70, talvez, com a música de dança, que era uma ideia que vinha de trás.»

Mão Morta
«O avô cavernoso»

Adolfo Luxúria Canibal: «Está a contar-se um segredo que convém que ninguém entenda e que ninguém saiba, ou antes, que a gente saiba, mas que não se saiba. (...) Na segunda parte, abrimos. As coisas já podem ser ditas, vociferadas, gritadas aos quatro ventos, porque já passou, e não passou. Penso que a letra está perfeitamente actual, mas noutra perspectiva. O que é certo é que já se pode gritá-la».

Sitiados
«A formiga no carreiro»

João Marques: «A nossa versão é um bocado apanhar o original e depois dar-lhe mais vivacidade (...)».
João Aguardela: «A escolha foi bem feita, a canção tem bastante a ver connosco (...), não foi preciso debater uma estratégia para fazer aquilo, fez-se naturalmente!»
«É difícil mexer em tudo o que o Zeca Afonso fez; as canções são muito perfeitas, muito acabadas. Custa e é difícil mexer naquilo».

Resistência
«Chamaram-me cigano»

Pedro Ayres de Magalhães: «Esta canção era (...) a que eu assobiava quando era puto, e gostava imenso, e depois tem a ver também com toda a letra, que respira duma grande fantasia, dos bruxedos, que penso que pertencem ao nosso imaginário».
«(...) Depois de gravarmos vinte e tal canções não tínhamos nenhuma guitarrada, no verdadeiro sentido do termo, e aproveitámos o ensejo para fazer uma guitarrada a sério, com solos por todo o lado, feitos por toda a gente».

Ritual Tejo
«Canto moço»

Paulo Costa: «Ao gravarmos este tema tentámos afastar-nos um pouco daquilo que é o nosso esquema de gravação (...) e procurámos fazer uma coisa mais orgânica».
Fernando Martins: «Joga a favor, por uma questão de espontaneidade, podermos ter mais liberdade em termos de expressão e interpretação, mas é um bocado pesado, porque o Zeca Afonso foi o Zeca Afonso e (...) é um pouco complicado estarmos a funcionar nesse sentido: corremos o risco de estar a falar de uma coisa que não sabemos».

Frei Fado D'El Rei
«Que amor não me engana»

Cristina Bacelar: «Penso que procurámos esta música essencialmente pelo seu intimismo, por toda a simplicidade melódica que tem e, sobretudo, pela mensagem.»
«(...) Quando se começa a tocar guitarra, uma das melodias que se procura é exactamente uma das melodias de Zeca Afonso. Eu não queria que isto fosse interpretado pela banalidade, mas pela simplicidade com que são feitas».

UHF
«A morte saiu à rua»

António Manuel Ribeiro: «Esta canção é tão forte -- é uma bandeira do Zeca Afonso -- que agarrar nela e fazer o que ele tinha feito era impossível e mau para nós. Então fizemos uma leitura. Sem menosprezar a música, acho que as palavras desta canção são fantásticas. Então, preocupei-me bastante em pô-las cá fora (...), em criar uma nova interpretação para cada vocábulo, cada substantivo. No fundo, fazer um bocado o que os UHF têm feito várias vezes, sacando a interpretação o mais possível para o nosso lado (...)».

Essa Entente
«Senhor arcanjo»

Paulo Salgado: «Penso que ambiente que a gente dá na canção também se insere na letra. Há um certo lado irónico, exagero que damos a certos aspectos musicais. Aquele início é um bocado esgotado no imaginário americano...»
«A versão foi apurada no concurso..., não deve haver muitos trabalhos que tenham dado tanto a volta.»

Madredeus
«Maio maduro Maio»

Teresa Salgueiro: «O Zeca tem músicas muito bonitas e esta é uma delas. Havia outras, mas escolhemos esta!»
Francisco Ribeiro: «Fomos fiéis ao tom. A versão é mesmo Madredeus, um arranjo simples.»

Peste & Sida
«O homem da gaita»

Luís Varatojo: «Este projecto até é bom para o pessoal da nossa geração, e mesmo para os mais novos virem a conhecer o trabalho dele, porque a maioria, se calhar, não iria preocupar-se em ouvir Zeca Afonso. Mas como até gostam das bandas que estão envolvidas, vão acabar por conhecê-lo através delas.»
João Cardoso: «Esta canção (...) tem muito a ver com o que o Zeca tinha na música dele: uma capacidade crítica enorme, e de fazer canções maravilhosas, que dão um prazer do caraças ouvir (...)».

Diva
«Canção de embalar»

Natália Casanova: «De certa maneira, subvertemos o andamento da música. (...) Na primeira parte, o conceito é Zeca Afonso, embora tenha qualquer coisa de Diva, mas achámos que o final era o expoente da música. É realmente a parte mais importante, que, no fundo, desperta mais as emoções das pessoas. Depois de ouvir a canção de embalar vêm todas as sensações».

Brigada Vítor Jara
«Ronda das mafarricas»

Aurélio Malva: «Em relação ao nosso tema -- cuja letra até não é do Zeca, é do António Quadros, embora não deixe de ter a grande marca dele, pela vertente musical --, acabou por ser um estímulo para nós, porque mostra o sentido de fazer música de raiz tradicional, procurar novas sonoridades. Ao fim e ao cabo, um pouco seguindo o exemplo do Zeca.»

Xutos & Pontapés
«Coro da Primavera»

Tim: «Dentro dos Xutos nunca tínhamos tocado Zeca Afonso, como aliás nunca tocámos músicas de outras pessoas (...)».
«A primeira aproximação, a primeira lembrança que temos do Zeca Afonso ao participar no projecto foi o `Coro da Primavera'.»

Kalu: «Tentámos manter a linha vocal o mais parecida possível, respeitar aqueles coros! A parte rítmica mudou bastante: é muito forte, muito actual.»

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Disco de Platina



Ao disco foi atribuído o galardão de Platina logo no lançamento.

Na imagem o galardão do Opus Ensemble - Site do grupo

domingo, 30 de janeiro de 2011

Concerto

Público, 1994/12/14

Mas adiante, porque o mais grave que ocorreu em Lisboa-94 da pop foi, justamente, aquilo em que foi colocado o maior investimento, isto é, a transposição para concerto de «Filhos da Madrugada», o disco de homenagem a José Afonso. O espectáculo em si não correu bem porque não encheu, porque o conceito de cada banda interpretar um original seu e outro do Zeca teve resultados desequilibrados e sobretudo porque do ponto de vista técnico não se resolveu adequadamente a questão do desfile de não sei quantos artistas pelo mesmo palco (que em rigor só teria dado certo se o palco fosse giratório).

Mas, pior que isso tudo, Lisboa-94 conseguiu a difícil proeza de colocar os músicos portugueses contra o primeiro mandato português de capital cultural europeia a propósito de «Filhos da Madrugada». Foi a tristemente famosa polémica dos «cachets» dos artistas, então amplamente coberta nestas páginas. Foi onde se descobriu que tudo para Lisboa-94 é hierarquizado. Não só a cultura pop vale menos que a institucional, mas dentro da pop há artistas de primeira, de segunda e até de terceira, ou pelo menos foi segundo esses três escalões que foram remunerados.

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PUBLICO-1995/02/14-140 PUBLICO-19950214-140 19950214 Cultura LMAI Madrugada embrulhada Lisboa 94 fechou em grande, fizeram uma linda festa. Mas as broncas nos bastidores não pararam de explodir, sobretudo no sector musical. Depois do diferendo com a SPA quanto ao pagamento de direitos de autor de um disco de fado abortado, é a polémica da transmissão televisiva do espectáculo «Filhos da Madrugada». No dia 30 de Junho de 1994, o Estádio de Alvalade albergava mais um megaconcerto. Desta vez o cartaz, além de mais extenso, era preenchido apenas por nomes nacionais. Apresentava-se ao vivo um disco colectivo de grande sucesso, fazia-se uma festa de massas e, de caminho, homenageava-se um dos maiores criadores musicais portugueses. Era o concerto «Filhos da Madrugada ao Vivo», produzido pela organização do Lisboa 94, que correu tão bem que até fez esquecer toda a polémica dos «cachets» dos artistas, que chegou a pôr em causa a sua realização. Mas os problemas cedo regressaram e há um pelo menos que na semana passada estava ainda por resolver. A organização de Lisboa 94 firmou, antes do concerto, um contrato com a RTP para a gravação e posterior exibição televisiva do evento. Pensada para os dias que se seguiram, esta exibição até hoje não foi concretizada, tendo Lisboa 94 enviado na semana passada cartas aos artistas num esforço derradeiro para ultrapassar o impasse. O Departamento de Programas Recreativos da 5 de Outubro, secção responsável pela gravação e posterior emissão do acontecimento, é claro: «`Filhos da Madrugada ao Vivo' não foi transmitido porque os artistas que nele participam ainda não declararam à RTP a sua autorização para o efeito. A RTP negociou com Lisboa 94 (...) e chegámos a acordo em todos os itens excepto num, quanto às declarações de direitos conexos [direitos de interpretação dos artistas]. Lisboa 94 não quis responsabilizar-se pela recolha de todas as declarações dos intervenientes no espectáculo», por razões logísticas, afirma Joaquim Silveira, chefe do departamento em causa. A não existência dessas declarações tem inviabilizado a transmissão de «Filhos da Madrugada». Isto embora a RTP, pela voz de Joaquim Silveira, diga que acredita na possibilidade dos artistas, ao assinarem o seu contrato de participação com Lisboa 94, terem já subscrito uma cláusula que contemplasse não só a gravação, como a posterior exibição do espectáculo na televisão, salvaguardando aí os direitos conexos. De resto, acrescenta Joaquim Silveira, Lisboa 94 afirmou à RTP, verbalmente, desde o início de todo o processo, que os direitos conexos estavam acautelados. «Mas nós não vimos esses documentos. Se Lisboa 94 os quisesse mostrar, poderia haver uma saída para esta questão. Mas neste momento não sabemos o que lá está acautelado.» Se a RTP decidir transmitir o concerto sem os artistas terem dado autorização, estes podem pôr uma providência cautelar nos tribunais e impugnar a emissão. «E a RTP não se vai sujeitar a isso», continua Joaquim Silveira. «Nós ainda não pagámos a Lisboa 94; portanto, o nosso prejuízo é apenas o de termos um programa gravado sem ir para o ar.» Joaquim Silveira verbaliza as dúvidas da televisão pública sobre todo o processo: «Será que Lisboa 94 disse aos grupos que ia vender isto para televisão? (...) Não percebo a atitude da organização. No próprio dia do espectáculo, estivemos para o não gravar, porque a Lisboa 94 não nos tinha dado as garantias das ditas declarações. Acabámos por gravar, apesar das declarações deverem, legalmente, ser entregues antes do espectáculo. Porque para haver gravação (e só para a gravação) não é necessária a declaração. Necessitamos é de ter toda a documentação referente ao processo tratada antes do concerto. Para não correr o risco que estamos a correr agora, que é não podermos exibir.» Mas a organização de Lisboa 94 incluiu uma cláusula no contrato que contemplava a gravação. «Do contrato consta a autorização para a gravação», afirma António Miguel, da empresa Regiespectáculo, produtora executiva do concerto, no qual, entre outros, participaram os UHF. António Manuel Ribeiro, líder da veterana banda almadense, corrobora esta versão: «Nós salvaguardámos o facto de ir ser gravado o espectáculo e resolvemos financeiramente a situação, ou seja, a Regiespectáculo pagou-nos (servindo de intermediário de Lisboa 94) para poder ser filmada a prestação dos UHF. (...) Pagou-nos dois `cachets', no fundo: um pela actuação e outro pela gravação.» Mas a concordância entre António Manuel Ribeiro e António Miguel fica-se por aqui. O líder dos UHF explica: «Há uns dias recebemos uma carta em papel timbrado da Lisboa 94 a pedir autorização para que o programa gravado fosse transmitido. E nós não temos problemas nenhuns em dar a autorização. Só temos uma questão a ver: normalmente a televisão pede para se cederem os direitos conexos, o que é aberrante, visto nos últimos tempos se ter chegado ao consenso dos direitos conexos serem pagos a quem de direito os detém, isto é, aos intérpretes.» Manuel Ribeiro admite que há um desfasamento entre a gravação e o pedido de autorização para a transmitir. «Mas pensei que, dados todos os problemas que surgiram com o espectáculo e com a necessidade de fazer misturas de som, o que demorou ainda dois meses, o atraso era justificável. Até porque eu estava era preocupado com a qualidade do som da gravação, antes de pensar na transmissão.» António Miguel tem uma interpretação diferente do contrato: «A RTP, com estes pedidos de declaração de autorização, está a pedir uma formalidade à Lisboa 94. É nosso entendimento que a questão da gravação e dos direitos conexos já estava prevista no contrato assinado. Os artistas estão a assinar agora estas cartas que a Lisboa 94 nos enviou com a declaração de autorização; não têm problema nenhum nisso. Mas o que a RTP está a fazer é uma redundância. Os músicos, quando assinaram o contrato inicial, sabiam que o programa ia para o ar. E o pagamento a ele referido foi efectuado. Por isso receberam um `cachet' maior. O que a RTP pede é uma mera formalidade.» A outra parte, e imprescindível para ajudar a esclarecer o assunto, é Lisboa 94. A pessoa responsável pelo mesmo, Ruben de Carvalho, manteve-se incontactável até à hora de fecho deste Pop Rock. Marta Duarte





PUBLICO-19941227-078
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19941227
Cultura
LMAI

Outras são as noites
«O mais importante da música portuguesa em 1993 aconteceu ao vivo», escrevíamos há cerca de um ano nestas mesmas páginas (5/1/94). Porque, há dois anos, a cena ao vivo cresceu, com os artistas portugueses a baterem-se em pé de igualdade com os estrangeiros, enchendo concertos de estádio no Verão e temporadas em salas fechadas no Inverno. 1994 não foi bem o oposto, mas este equilíbrio de forças foi drasticamente alterado. Da elite de pouco mais de meia dúzia de bandas que antes subiram ao estrelato dos estádios, metade passou um mau ano de concertos ou desapareceu mesmo da cena ao vivo: dos Resistência e dos 7ª Legião mal se ouviu falar; os Xutos tiveram um ano menos produtivo; e os GNR, apesar de um novo álbum nos escaparates, acabaram por cancelar a digressão. A razia poupou os Delfins e os Sitiados, para os quais 1994 foi um ano normal de concertos (cerca de 60 para cada uma das bandas), embora fora dos maiores recintos. Mas foram sobretudo os Madredeus que se viram mais solicitados que nunca (cerca de 120 concertos), só que a maior parte dos seus espectáculos se realizaram no estrangeiro.
A crise do sector da música ao vivo deverá ser atribuída a um menor investimento da parte das autarquias, à carestia das produções e do preço dos bilhetes e ainda às crescentes dificuldades financeiras do público juvenil.


Estes factores, porém, não explicam tudo e o único espectáculo português de estádio em 1994, Filhos da Madrugada, em Alvalade, contou com todos os apoios, ingressos a preço de saldo e, no entanto, não constituiu nenhum sucesso de bilheteira.

Mas tudo o que correu mal aos veteranos saiu bem ao estreante Pedro Abrunhosa, que viveu um ano triunfante, com 120 concertos dados em território português (e cerca de 400 recusados), a uma média de 2500 espectadores por noite e a esgotar os coliseus de Lisboa e Porto em Dezembro. Um bom ano também, embora jogando noutro campeonato, tiveram bandas como os Ena Pá 2000, os Irmãos Catita e os Despe & Siga. O que dá que pensar, pois, tal como os Bandemónio, estes nomes introduziram sexualidade «hardcore», humor picante e uma irreverência política e de costumes, a contrastar com o modelo de espectáculo autenticista das bandas rock consagradas.
Essa eventual falência do rock «mainstream» à portuguesa não impediu, contudo, o crescimento do circuito alternativo. Hoje, não apenas Lisboa tem o seu clube rock no Johnny Guitar, mas também o Porto, com o Palha d'Aço, enquanto se multiplicam por todo o país os espaços -- desde discotecas a cinemas e teatros -- vocacionados para a música ao vivo, protagonizada por artistas em início de carreira.

Luís Maio / Público

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Filhos da Madrugada

«Filhos da Madrugada», o duplo CD de homenagem a Zeca Afonso, vai estar disponível a partir de 27 de Abril. O alinhamento definitivo do álbum começa, no primeiro CD, com a interpretação de «Maio maduro Maio» pelos Madredeus; seguindo-se «Coro dos tribunais» pelos GNR; «A formiga no carreiro», pelos Sitiados; «Os índios da Meia-Praia» pelas Vozes da Rádio; «Venham mais cinco», pelos Tubarões; «O homem da gaita», pelos Peste & Sida; «Canto moço», pelos Ritual Tejo (o tema que tem o verso que dá nome ao disco); «Vejam bem», pelos Delfins; «Canção de embalar», pelos Diva; e «Era um redondo vocábulo», pelos Opus Ensemble. O CD 2 arranca com o «Coro da Primavera», pelos Xutos & Pontapés; «Cantigas do Maio», pela Sétima Legião; «Chamaram-me cigano», pelos Resistência; «Trás outro amigo também», pelos Entre Aspas; «O avô cavernoso», pelos Mão Morta; «Que amor não me engana», pelos Frei Fado D'El Rei (um dos grupos vencedores, junto com os Essa Entente, do concurso levado a cabo para recolha de participações de bandas menos conhecidas); «O que faz falta», pelos Censurados; «Ronda das Mafarricas», pela Brigada Vítor Jara; «A morte saiu à rua», pelos U.H.F.; «Senhor arcanjo», pelos Essa Entente; e finaliza com «Grândola Vila morena», interpretada pelo colectivo formado por músicos da maior parte dos grupos intervenientes e pelo Coro de Santo Amaro de Oeiras. As gravações levaram 44 dias e as misturas levaram mais 20. O arranjo gráfico da capa é de Henrique Cayatte sobre uma fotografia de Luís Ramos, fotógrafo do PÚBLICO.

Publico

FILHOS DA MADRUGADA CANTAM JOSÉ AFONSO

25 DE ABRIL DE 1994 (20º ANIVERSÁRIO DO "25 DE ABRIL")

Tributo a José Afonso

CD 1

Madredeus - Maio Maduro Maio
G.N.R. - Coro dos Tribunais
Sitiados - A formiga no carreiro
Vozes da Rádio- Os Índios da Meia Praia
Tubarões - Venham mais cinco
Peste & Sida - O Homem da Gaita
Ritual Tejo - Canto Moço
Delfins - Vejam Bem
Diva - Canção de Embalar
Opus Ensemble - Era um redondo vocábulo


CD 2

Xutos & Pontapés - Coro da Primavera
Sétima Legião - Cantigas de Maio
Resistência - Chamaram-me cigano
Entre Aspas - Traz outro amigo também
Mão Morta - O avô cavernoso
Frei Fado D'el Rei - Que amor não me engana
Censurados - O que faz falta
Brigada Victor Jara - Ronda das Mafarricas
UHF - A Morte saiu à rua
Essa Entente - Senhor Arcanjo
Grândola Vila Morena

Vários - "Filhos da Madrugada", 1994 - Ed. e distri. BMG:

Destinado a comemorar a passagem de duas décadas sobre a Revolução dos Cravos, "Filhos da Madrugada" terá sido o projecto de maior envergadura alguma vez ensaiado na música portuguesa. Foi o pico de uma vaga de tributos (António Variações, Teresa de Noronha), naturalmente focado - dado o teor da efeméride - na memória de José Afonso. À partida havia dois projectos distintos: um de Sérgio Godinho que previa a recriação do autor de "Grândola" por vozes singulares, outro de Tim e João Gil, preferindo confiar a homenagem a bandas actuais. Vingou o segundo, embora fosse quase seguro que uma solução de compromisso teria produzido melhores dividendos artísticos.

No final foram apuradas duas dezenas de bandas para igual número de canções de Zeca sob a coordenação/produção de Manuel Faria - o que não chegou para assegurar a coerência de releituras assinadas por fãs confessos do Zeca, mas também por impugnadores seus mais ou menos arrependidos, por bandas consagradas e por estreantes nas mais diversas latitudes musicais. Numa óptica retrospectiva, no entanto, sobressaem pelo menos três grandes virtudes: a capacidade de iniciativa de uma indústria nacional que depois se veio a eclipsar, a vitalidade da última época em que a produção nacional rivalizou com a estrangeira e ainda a universalidade do legado de Zeca, susceptível de todas as releituras uma década depois do seu desaparecimento.

Luís Maio / Público, 08/05/2002